Retratistas do Morro

O projeto Retratistas do Morro, desde de 2015, trabalha com objetivo de contribuir para a preservação do patrimônio histórico-cultural nacional e ampliação do entendimento sobre a história das imagens no Brasil, com ênfase em narrativas visuais produzidas principalmente por retratistas tradicionais que atuaram nas favelas e comunidades do país, por meio do mapeamento, identificação, catalogação e restauração desses acervos fotográficos.

A Comunidade do Aglomerado da Serra

O início da pesquisa constituiu em realizar um levantamento para identificação desse grupo de retratistas que atuaram na Comunidade do Aglomerado Serra, em Belo Horizonte, ao longo dos últimos 50 anos, registrando o cotidiano de seus moradores.

A comunidade, onde moram mais de 70.000 pessoas, numa área equivalente a aproximadamente 1.500.000 m2, com cerca de 14.000 moradias, é resultado da expansão populacional e territorial de vilas menores que foram surgindo na encosta da Serra do Curral, a partir de 1914, ainda como solução para muitas famílias que vieram do interior para colaborar na construção da capital mineira ou a procura de emprego e não tinham onde morar.

Dentre os fotógrafos com os quais passamos conviver de forma mais próxima se destacaram, Afonso Pimenta e João Mendes, por estarem atuando na região desde o final da década de 1960 e pelo volume de seus acervos que juntos somam mais de 40.000 fotogramas, entre negativos P&B de médio formato (6×6) negativos coloridos 35mm, monóculos e negativos de ½ 35mm.

As imagens produzidas por eles nos revelam outras versões da história das cidades e das populações de favela no Brasil, contadas a partir das experiências e visão de mundo de seus moradores.

A trajetória de João e Afonso, de quase meio século, se tornou um dos poucos acervos imagéticos, ainda com possibilidade de restauração, sobre a memória visual da cidade de Belo Horizonte, capaz de conectar as histórias de vida dos moradores do aglomerado, suas lutas e conquistas, à historia da capital mineira.

Entre seus gestos fotográficos quase despretensiosos, voltados para o registro de uma realidade familiar e seus movimentos cotidianos, acompanhando intimamente o acontecimento de casamentos, nascimentos, batizados, jogos de futebol, velórios, formaturas, bailes e construções de barracos deixa-se transparecer as mudanças que ocorreram, ao longo do tempo, nos cenários social, político, econômico e cultural naquela região, a exemplo do que é visto em várias outros locais pelo Brasil.

É fundamental reconhecer a importância da preservação das memórias e patrimônios culturais que representem o fruto da experiência coletiva das populações brasileiras, possibilitando assim a formação de imaginários e noções históricas, baseadas em múltiplas narrativas, imagens, percepções e pontos de vista, que permitirão interpretações menos desiguais e distorcidas das realidades que nos cercam.

Essas imagens, além de representarem a memória imagética e as identidades culturais da cidade de Belo Horizonte, são também documentos de valor histórico, político e social, de alcance nacional, que apresentam uma visão ampliada sobre a trajetória das metrópoles brasileiras e suas as populações.

Atualmente conseguimos restaurar quase 40 imagens, que já demonstram o potencial de transformação simbólica desses acervos. O projeto recentemente, em outubro de 2017, recebeu do IPHAN o prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, que irá possibilitar a continuidade dos trabalhos de recuperação e catalogação de mais algumas fotografias. Nossa intenção é ampliar este número de imagens restauradas a cada dia e torna-las públicas e acessíveis.

Retratistas do Morro